Momento (final)

Oi, gente!

O post de hoje é a continuação do miniconto "Momento" que você pode encontrar clicando aqui, caso não tenha lido a primeira parte. Eu preciso confessar de antemão, que adoraria se ele tivesse tido um outro final.  E vocês?

Beijinhos, 

Malu

*****

Continuação...


Fazia exatamente um mês desde aquele dia. Depois que saiu do carro de Willian, Eliza desistiu de ir à faculdade naquela manhã. Estavam no final do semestre mesmo, e ela sabia que os professores não tratariam mais de nenhum conteúdo importante. Assim, sentindo que precisava organizar os pensamentos e as emoções, ela se dirigiu ao Cubas'Café - point dos alunos que costumavam se reunir ali depois das aulas. Lá ela sentou numa mesa mais ao fundo do salão, pediu um suco de laranja com uma porção de croissants, e mais uma vez se deixou levar pelas páginas de “Persuasão”, o livro que ela ainda não terminara de ler desde aquela tarde quando estivera com William. Chegou em casa somente no final do dia, e encontrou uma Catarina já preocupada que não sossegou enquanto ela não lhe contou tudo o que havia acontecido. Depois, exausta, tomou um banho, jantou e se jogou na cama, adormecendo logo em seguida.

***

Recordando todos esses acontecimentos agora, lembrando da facilidade com que conseguiu se afastar de William - depois do que houve entre eles – até a chegada das férias, Eliza percebeu que ainda não estava preparada para relacionar-se novamente. Conhecê-lo, estar com ele, mostrou-lhe isso claramente. Na verdade, embora sentisse que não devia ter se deixado levar por uma mera atração física, porque foi isso o que se deu entre eles, Eliza não se arrependera e nem o culpava. Lógico que ficara magoada com as palavras e o comportamento do seu ex-professor, por ele tê-la julgado sabe Deus como para achar que ela aceitaria a proposta de “diversão” que ele a fizera naquela manhã, mas entendia que ele não fizera nada mais, nada menos que o papel dele. E, quanto a ela, acabara chegando a conclusão de que aquela experiência serviu-lhe para mostrá-la que o passado que ela tentara deixar para trás ainda continuava presente, vivo dentro dela. 

Eliza refletia sobre todos esses fatos ali, na casa dos seus pais, onde decidira passar as férias da faculdade. Naquela casa ela sabia que se encontrava no único lugar que realmente lhe oferecia segurança e paz. Era daquelas ruas, da pracinha em frente ao colégio, daquela cidade, que ela guardava as melhores lembranças da sua vida, embora uma destas ainda lhes doesse fundo na alma... “Não, não vou lembrar tudo de novo”, ela balançou a cabeça tentando espantar os pensamentos, mas, como se consegue isso quando trazemos uma história viva dentro de nós? Era exatamente esse o seu caso. Sua história com Fred ainda falava alto em seu coração, apesar do intervalo de tempo transcorrido desde a última vez em que se viram, e apesar distância que os separava agora. Fora - ela acabou constatando - na tentativa de preencher a falta que Fred lhe fazia, que ela confundiu tudo, e se deixou levar pelas atenções e investidas de William. 

***

Eles se conheceram num momento delicado da vida de Eliza. Faziam o cursinho juntos quando ela chegou ao fundo da depressão que a acompanhava desde o início da adolescência. Eliza parou de frequentar as aulas, passava o dia trancada no quarto, deitada sob as cobertas. Seus pais não sabiam mais o que fazer, pois apesar da filha nunca ter sido um exemplo de alegria, agora que fizera 18 anos seu estado de ânimo parecia-lhes assustador. Foi assim que certo dia viram com esperança a visita daquele rapaz que insistia em falar com Eliza. Inicialmente estranharam quando ele disse que estudava com a filha, pois nunca ouviram-na mencioná-lo antes, mas, ainda assim, notando o interesse e a preocupação em seus olhos, deixaram-no entrar e falar com ela.

Dessa primeira visita que Fred lhe fez, Eliza só consegue recordar do susto que sentiu ao vê-lo entrando em seu quarto, enquanto sua mãe fechava a porta, deixando-os sozinhos. Eles eram colegas de sala sim, era com ele que ela mais conversava quando estava no cursinho, mas não passou pela sua cabeça naquele momento o quê ele queria ali, no seu quarto, principalmente ela estando no estado em que se encontrava.

Vendo-o em pé a poucos centímetros da sua cama, Eliza sentou-se rapidamente e enquanto cobria-se com o edredom, olhando-o incrédula, perguntou:
"- Que você tá fazendo aqui, Fred?"
"- Oi, Eliza! Boa tarde, né? Eu vim te ver, uai! Há dias você não vai às aulas, e como estamos quase na reta final, vim perguntar se você quer mesmo passar no vestibular ou não." Ela não pôde evitar o sorriso ao perceber que ele tentava parecer bravo, embora seus lábios denunciassem o esforço que ele estava fazendo para conter o riso que teimava em aparecer.
"- Ah, Fred... Obrigada pela visita, mas não vou mais às aulas não. Vou até cancelar minha matrícula, só não o fiz ainda porque..."
"- Nãããooo! Você não vai fazer isso não! Você vai voltar às aulas sim, nem que eu tenha de vir buscá-la todos os dias. O que é isso, Eliza? Cadê a garota que sonha em ser psicóloga? Cadê a mulher decidida que esnoba todos os caras da turma, e que só não me jogou pra escanteio porque eu dei uma de maluco?
"- Quanto à psicologia eu posso tentar ano que vem, Fred." - Eliza tentou se justificar, e forçando um sorriso, continuou: " - E, em relação a essa mulher aí, eu não sou ela não... Apesar de você, sim, ser meio maluco."
"- Então, se você já sabe que sou maluco, não vai arriscar e discutir comigo, vai? Amanhã passo aqui às 7h:00 em ponto pra te buscar, esteja pronta por favor!" - ele disse isso enquanto beijava-lhe a testa e, dirigindo-se à porta, falou: "- Ah, ia me esquecendo, trouxe esse presente pra você. Espero que goste. A personagem tem o seu nome." Pondo o embrulho sobre o criado mudo, olhou-a novamente e saiu.

Eliza tentou falar alguma coisa, mas não teve jeito. Fred já tinha ido embora. "Quem ele pensa que é pra dizer o que eu devo ou não fazer? Ele que não me apareça aqui amanha, ora!" Resmungando essas palavras, voltou a deitar-se e ficou assim por alguns minutos até que o presente de Fred começou a chamar sua atenção.  Ela tentou ignorá-lo, ficou revirando de um lado pro outro na cama, mas lembrou do que ele disse - "a personagem tem o seu nome" - e não conseguiu ficar indiferente. Pegou o pacote, desembrulhou-o e deu de cara com um livro cuja capa dizia "Orgulho e Preconceito".  O título despertou-lhe o interesse, aguçou-lhe a curiosidade... Foi a partir dessa dia, da primeira visita de Fred, do livro que ele lhe dera e que ela começara a ler ainda naquela tarde, que, sem perceber, Eliza começou a sair do fundo do poço em que se encontrava.
O celular tocou, mas não era o despertador e muito menos uma chamada. Era uma mensagem de Fred. Às 6h:00 da manhã.  "Daqui a uma hora tô passando aí. E se vc não for à aula, azar o seu. Vai ter que me aguentar a manhã inteira. Até daqui a pouco. Bjo!" Eliza não acreditou no que seus olhos viram, leu o texto uma, duas, três vezes. Quando no relógio do celular apontou 6h:30 ela achou melhor não arriscar. "Vai que aquele maluco vem mesmo!" Levantou, tomou um banho rápido, vestiu um jeans e uma camiseta, fez um rabo de cavalo no cabelo, passou um gloss pra dar um pouco de cor ao seu rosto pálido e foi até a cozinha onde sua mãe já estava pondo a mesa para o café. Vendo-a arrumada, a mãe sorriu e correu para abraça-la. Eliza abraçou-a de volta, dizendo que estava tudo bem, ela iria pro cursinho com o maluco que viera visitá-la ontem. Não demorou muito, Fred chegou.

Foi assim, ela recordava, com a ajuda e os empurrões do amigo, que ela recomeçou a viver. Reconhecia que ainda trazia a tristeza no olhar, sentimento sobre o qual ela e Fred conversaram em alguns momentos, quando ela lhe explicou que não sabia porque se sentia assim. Sabia apenas que era um sentimento que nascera com ela e contra o qual nem sempre conseguia lutar. Ele sempre a ouvira pacientemente, aliás, desde o início ele foi seu amigo acima de tudo. Deu-lhe apoio, carinho, atenção. Às vezes, quando se encontravam para estudar, ela sentia que ele demorava o olhar sobre ela e num desses momentos o surpreendeu, devolvendo-lhe o olhar, mas ele então desviou rapidamente a atenção para o livro que tinha entre as mãos e o silêncio se fez entre os dois por alguns minutos, até ele dizer alguma das bobeiras que sempre a faziam rir.

Com o passar do tempo, e a amizade de Fred cada vez presente em sua vida, Eliza passou a se perguntar se todos aqueles olhares, se toda aquela atenção queriam dizer alguma coisa. Questionou a si mesma o porquê da necessidade de tê-lo por perto, analisou os próprios sentimentos, tentou entender o que se passava entre eles, e acabou por perceber no carinho ofertado e sem qualquer exigência de reciprocidade, muito mais que a amizade sobre a qual eles sempre conversavam, dizendo da importância dela em suas vidas. Desde então ela  ficou sem saber o que fazer, primeiro porque nunca imaginou-se despertando o interesse de homem nenhum. Segundo porque ela temia se entregar a um sentimento, temia perder o pouco do controle que ainda conseguia ter sobre seu coração. Eliza se sentia insegura,  uma vez que os fantasmas que a levaram a depressão ainda a assombravam, ainda lhes diziam que estava confundindo tudo.

Deitada no seu quarto, segurando o livro que ele lhe dera de presente, Eliza recordou da última semana do cursinho, lembrou que os dois queriam muito passar no vestibular, do quanto torciam um pelo outro; e, de que a perspectiva da separação que se fazia cada vez mais próxima começou a perturbar-lhes. Fred passou a demonstrar excessiva ansiedade, enquanto ela começou a se fechar, permanecendo calada a maior parte do tempo quando eles estavam juntos. Sentindo o coração encher de saudade, ela sorriu ao lembrar do dia em que as coisas ficaram claras entres eles. Era quinta-feira, véspera do último simulado no cursinho...

Eles haviam passado a tarde estudando em seu quarto, estavam exaustos física e mentalmente, e ele percebendo que ela não estava mais conseguindo se concentrar, fechou o livro dizendo:
"- Janta comigo hoje a noite!?"
"- Como?"
"- Vamos sair, vamos jantar, vamos espairecer. Eu tô cansado e vejo o cansaço em seus olhos. Diz que sim vai, só hoje, por mim, sai dessa redoma atrás da qual você se esconde." - ele falou, olhando-a fixamente. Pela primeira vez, Eliza corou diante dele. Talvez por ele ter percebido que na maioria das vezes ela tentava se esquivar das situações, parecer invisível; ou, talvez, por ter sentido - pela primeira vez - nas palavras dele, algo além de um convite de amigo.  Todavia, apesar da vontade de sair correndo dali, de não mais voltar a encontrar Fred, ela baixou a cabeça e depois de refletir por alguns momentos, voltando a encará-lo disse sim ao pedido. Nesse momento, Eliza viu um sorriso lindo se abrir no rosto de Fred e sentiu o coração pular dentro do peito quando ele, mesmo estando do lado oposto da cama, levantou e deu-lhe um beijo no rosto.

Faltava quinze minutos para a hora marcada. Fred a pegaria às 20h:00 e eles iriam para o único restaurante da cidade. Não era primeira vez que Eliza saía com rapazes, não era nem a primeira vez que ela saía com Fred. Mas agora as coisas pareciam diferentes. Os sentimentos dela estavam diferentes, enquanto Fred continuava sendo seu amigo, embora os dele lhes parecesse cada vez mais evidentes. "Mas e for só minha imaginação? Se eu estiver confundindo o carinho que ele tem por mim, pela nossa amizade?" - ela vinha se fazendo essas perguntas há alguns meses, e assustada percebeu que adoraria se não fosse uma peça pregada pela sua imaginação. Mas ela não seria ela se não estivesse com medo, principalmente agora em que eles estavam prestes a se separar. Olhando-se no espelho tentou espantar todos esses pensamentos e disse a si mesmo que naquele momento só lhe importava aquela noite. Que o futuro se encarregasse de si mesmo.

Ela lembrou que Fred chegou na hora marcada, falou rapidamente com os pais dela prometendo trazê-la sã e salva na manhã do dia seguinte. Lembrou sorrindo do beliscão que ela lhe deu por conta de tal brincadeira, e que sem graça, deu até logo à sua mãe, que fez questão de acompanhá-los até o portão. Naquele momento, quase oito meses depois daquele dia, Eliza recordou que ele fez de tudo para que o silêncio não se fizesse entre eles durante o trajeto: fez piada comentando a cara de brava que ela fez quando ele brincou com os pais dela, comentou sobre o vestibular e o quão preocupado e ansioso ele estava, e disse por fim que tentara, mas não podia e nem queria deixar de comentar o quanto ela estava linda. Mais linda. Ela que já vinha rindo há tempos, riu mais uma vez - só que dessa vez com a face ruborizada -, agradeceu o elogio, e deu graças a Deus quando eles chegaram ao restaurante. 

"- E aí, como a gente vai fazer depois do vestibular?" - ele perguntou quando se acomodaram à mesa.
"- Bom, se eu passar vou ter que me mudar pra capital, né? Pensei em ficar indo e voltando todos dias, mas seria muito cansativo e dispendioso financeiramente também. Daí andei conversando com algumas meninas do cursinho, e Catarina me falou de uma república, perguntou se eu não queria experimentar ficar lá. Talvez essa seja a minha opção."
"- Você não entendeu mesmo minha pergunta, ou só escorregou pela tangente?"
"- Acho que não entendi, Fred... Se não era pra ser essa a resposta, me explica, o que você perguntou, então?"
"- Eliza, eu quis saber da gente. Nós. Eu e você. O que faremos depois do vestibular? Seguiremos cada um pra um canto? Vai ser assim mesmo?"
"- Eu não sei, espero que a gente continue se falando..." - ela começou a responder, esforçando-se para que a voz saísse-lhe da garganta, mas ele a interrompeu:
"- Poxa, garota, você não percebeu ainda que eu gosto de você? Que muito antes de ir na sua casa naquele dia eu já gostava de você? E que hoje, hoje Eliza, depois desses sete meses convivendo com você, eu sinto que posso te dizer sem medo e sem dúvida que eu te amo? Você não percebeu isso?

Eliza deixou as palavras de Fred ficarem no ar enquanto ela sentia o toque da mão dele sobre a sua. Ela não sabia o que falar, seu coração acelerado, seus pensamentos transitando entre o medo de revelar os seus sentimentos, e a vontade de dizer que sim, que ela também o amava; que descobrira isso já há algum tempo, mas que ainda não aceitava esse sentimento em seu coração.

"- Diga alguma coisa!" - Fred falou exibindo um leve sorriso lábios, mas pelo modo como ele a olhava, ela percebeu a aflição que ele também experimentava.
"- Fred, eu não sei... Nossos sentimentos foram ganhando outra conotação com o passar do tempo, venceram os limites da amizade e isso me assusta. Eu não sei me expressar, você me conhece, mas não posso deixar de dizer que gosto muito de você. É amor? Eu não sei dizer, só sei que eu queria que as coisas pudessem ser diferentes entre a gente. Mas não são, e nem podem ser. Nossas vidas vão seguir por outros caminhos agora..." - ela parou de falar quando o garçom chegou trazendo o jantar, e Fred aproveitou para respondê-la quando aquele saiu:
"- Não, nossas vidas podem seguir o mesmo caminho. É provável que a distância torne as coisas mais difíceis, mas a gente supera. Além do quê, vai que nós dois passemos para a federal?"
Eliza balançou a cabeça, como que tentando acreditar na possibilidade que ele levantava.
"- Eu não sei Fred. Se conseguíssemos os dois essa façanha, seria perfeito. Mas e se não? Se você for para outro estado? Eu não tenho estrutura emocional para um relacionamento à distância."
"- Ôh, eu também não me imagino mais morando longe de você, sem saber como você está, o que está fazendo... Mas a gente pode tentar... Namora comigo? Diz que sim, Eliza?!"
Nesse momento, entre o medo e o sentimento que nutria por Fred, ela optou pelo sentimento. Sorriu para o até então amigo e respondeu:
"- Eu tenho medo, muito medo, Fred. Mas, estou apaixonada por você."


Cartas postas na mesa, sentimentos revelados, a partir daquele momento a noite do casal, agora namorados, foi marcada por beijos e carinhos. Eliza lembrou que saindo do restaurante, eles ainda ficaram por quase duas horas na pracinha do colégio aproveitando o tempo que cada vez mais lhes parecia tão pouco. Aliás, o tempo foi o grande fantasma que interferiu no relacionamento deles, ela reconhecia isso. Aproveitando as vésperas do vestibular, Eliza e Fred passavam a maior parte do tempo juntos: estudavam, passeavam, curtiam a presença um do outro, agora vivenciando não só a amizade, mas o amor que os unia. Mas, a medida que os dias foram passando, e principalmente depois das provas que ambos fizeram na universidade federal, a preocupação com os dias futuros começou a atormentá-la. "E se um de nós não passar, como faremos?" Era esse o seu pensamento mais frequente, e talvez como que por uma espécie de intuição, ela refletiu sobre a decisão que dias depois viria ser a mais difícil que já tomara até ali.

Eliza não podia acreditar que mesmo passados oito meses, seus olhos ainda enchessem de lágrimas ao recordar daquele dia.

Em seu quarto, eles tinham acabado de abrir o site da faculdade onde esperavam ver seus nomes entre os dos candidatos aprovados no vestibular. Ela - principalmente - rezara por isso dias e noites, porque já havia se decidido caso acontecesse o contrário. E foi pela decisão tomada que começou a chorar quando perceberam que somente um deles tinha conseguido entrar para a desejada faculdade. Recordando o seu choro compulsivo que não lhe permitia nem comemorar tal conquista - uma vez que somente ela tinha sido aprovada - ela viu novamente o rosto de Fred passar da alegria para a aflição, quando ele perguntou: "- Por que você tá chorando, amor? Você passou, tá tudo bem!"
"- Não, Fred. Estaria tudo bem se você tivesse passado também." - ela disse tentando conter as lágrimas.
"- Ah, mas não tem problema. Lembra o que eu falei? Mesmo que eu passe numa universidade em outra cidade ou estado, nada vai mudar entre a gente." - Fred disse enquanto a abraçava.
"- Não... - ela respondeu, enquanto o encarava depois de retribuir-lhe o abraço - ...não sei se estou preparada para um relacionamento a distância. Você me conhece."
"- Eliza, nós já conversamos sobre isso, lembra? Já lhe falei que não quero me afastar de você. Vamos viver e enfrentar isso juntos. E mais, vamos conseguir." 
Interrompendo-o, ela esclareceu: "- E eu não queria isso, Fred, mas já me decidi."
"- Como assim? O que você decidiu?" - ele perguntou, entre incrédulo e indeciso, temendo a resposta.
"- Nosso namoro termina aqui..." - ela disse enquanto lágrimas escorriam pelo rosto - "...a gente vai ter que se afastar porque eu vou pra faculdade, e você também, eu sei. Lamento que não seja da forma como desejamos, mas, por ora, acho que é o melhor a fazer."
"- É sério, Eliza? É isso o que você quer?" - ele perguntou antonito. "- Não é o que eu quero, mas é o que eu preciso fazer. Namorando a distância, isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde, certo? E em circunstâncias que poderiam acabar com os sentimentos construimos ao longo de todo esse tempo, Fred."
"- Olha, nada do que você me falou até aqui faz sentido pra mim. O que sei é que distância nenhuma afetaria meu sentimento. Mas, se é realmente isso o que você deseja, eu vou respeitar sua decisão, a gente termina aqui. Não esquece, porém, que foi uma escolha sua... E que eu amo você." - ele falou essas últimas palavras e, levantando da cama onde estava sentado ao lado dela, saiu batendo a porta.

Foi aquela a penúltima vez que eles conversaram, ela refletia agora, olhando para o mesmo lugar da sua cama onde ele sentara naquela e em outras tantas vezes. Lembra que chorou dias seguidos, e que tentou encontrá-lo depois, mas ele passou a evitar maiores aproximações, além dos momentos em  que o acaso os aproximava. Passou-se todo o mês, e ela teve de começar a preparar sua mudança para a capital, organizar a papelada para a matrícula na faculdade. Uma semana antes de viajar, ela recebeu uma mensagem no celular: "Oi... eu ainda não entendi porque você quis assim. Evitei te encontrar na esperança de você sentir falta de nós dois, reconsiderar e voltar atrás na sua decisão, mas parece que você não quer mesmo isso. Então acho que já está na hora de seguir meu caminho também. Viajo amanhã. Independente de qualquer resultado de vestibular, nessa cidade não dá mais para ficar. Adeus, Eliza." Ela terminou de ler a mensagem com lágrimas nos olhos e o coração como que querendo explodir de uma dor sem igual.  Àquela altura, ela já não sabia se tinha tomado a decisão certa, mas tinha certeza que já não podia voltar atrás. A vida tinha traçado seus próprios caminhos e os deles aparentemente tinham se desencontrado. "Seria para sempre?" - era a pergunta que ela se fazia, agora, oito meses depois do fim. E apesar de não saber a resposta, de uma coisa ela já não tinha mais dúvida: Fred tinha sido o único homem que ela realmente amara... 

* Fim *

"Todas as noites ela pensa nele, e todas as manhãs ele pensa nela. E assim vão vivendo até quando a vontade de estar com o outro for maior do que os outros. Enquanto o mundo vive lá fora, dentro de cada um tem um pedaço do outro. E mesmo sorrindo por ai, cada um sabe a falta que o outro faz. Nunca mais se viram, nunca mais se tocaram e nunca mais serão os mesmos. É fácil porque os dias passam rápidos demais, é difícil porque o sentimento fica, vai ficando e permanece dentro deles. E todos os dias eles se perguntam o que fazer. E imaginam os abraços, as noites com dores nas costas esquecidas pelo primeiro sorriso do outro. E que no momento certo se reencontrem e que nada, nada seja por acaso." - Tati Bernardi


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4 Comentários

  1. Ai meu coração!
    Quer me matar, atira menina, que é mais fácil!
    O que eu posso dizer? Estou atônita!
    Como você passa de "Orgulho e Preconceito" a "Persuasão" e me deixa assim, desse jeito?
    E apesar de eu preferir um final feliz bem clichê e romântico e perfeito, isso não significa que o seu "Final sem final" não esteja fantástico!
    Adorei. Adorei tudo!
    Parabéns Malu!
    Fica aqui minha invejinha porque eu queria ser capaz de escrever algo assim!
    Bjossssss

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    1. Percebeu a ironia, Ju? rs
      A gente "detonando" o filme hoje, e agora que me dei conta que o "Momento" seguiu o mesmo estilo, quase! rs Mas, sabe, esse "final sem final" já estava pronto... Por mais que eu também quisesse um daqueles bem clichês, romanticos e perfeitos, ele ñ caberia na história de Eliza e Fred. Coisas dessa imaginação maluquete, ou da vida, sei lá! :)
      Fico feliz que você tenha gostado, apesar do desfecho! Quanto a invejinha, vou levar em conta como incentivo de amizade, porque você escreve contos fantásticos, e sabe disso! Obrigada, ta?
      Beijos gêmeos!

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  2. Malu, como já te disse, essa história dará um lindo livro! Pense com carinho e mergulhe nessa ideia. Me mandarei urgente para o Ceará (ou onde for o lançamento) porque quero estar na primeira fila aplaudindo de de pé! Por favor, continua essa história, Eliza é um exemplo de mulher!
    Beijos!

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    1. Então, Cá... por enquanto é esse o fim da história de Eliza e Fred. Nada me ocorreu depois das reticências finais. Mas, se tem algo que eu aprendi nesse universo da escrita, é que de qualquer coisa pode vir uma inspiração. Então, se algo surgir na história desses dois, com certeza vai vir parar aqui e vcs serão as primeiras a saber.
      Obrigada de verdade! Beijos! <3

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